Uma Tasca à antiga!
Quem é que não adora uma boa tasca?! E atenção, nem estamos a falar das tascas modernas, estamos sim a falar daquelas tascas antigas de Lisboa, que continuam a servir os mesmos pratos caseiros feitos geralmente por cozinheiras com mais de 50 ou 60 anos, que têm geralmente um senhor da mesma idade atrás do balcão a aviar serviço, com mais ou menos simpatia. Paredes em azulejos berrantes e cheias de molduras com fotografias ou recortes de jornal. Televisão acesa, com o som audível (e sempre mais alto quando está a passar a bola). Ementa pendurada na porta diariamente, travessas de inox a sair da cozinha para as mesas, pousadas em cima das clássicas toalhas de papel. Isto são tascas à antiga! Tascas como O Restaurante Sardinha!
Tínhamos O Restaurante Sardinha na nossa lista de restaurantes a visitar há muito tempo. Porque essa lista é composta por todo o tipo de restaurantes, e há muitas destas tascas emblemáticas perdidas pelos bairros da cidade que temos referenciadas e às quais queremos mesmo ir, com medo que acabem por fechar portas entretanto (como já aconteceu a muitas). Fazem parte do nosso património como cidade e devem ser preservadas, até porque a maioria das vezes são (ainda) verdadeiros achados. Como O Sardinha, que é mesmo daquelas tascas à séria!
Ora… o que é que se faz neste tipo de tascas? Convive-se, sempre a beber uns copos! Por isso, e por sabermos que aqui não há reservas (porque os clientes habituais têm “prioridade”), chegamos mais cedo. Sentamo-nos, bebemos umas cervejas, acabamos com os Pastéis de Bacalhau que existem na montra (que são muito bons, mas já frios e moles, serão da hora de almoço), pedimos pão e queijos enquanto chega o grupo completo. E enquanto chegam também os clientes das restantes mesas, que enchem O Sardinha e criam aquele volume de som que associamos a pessoas divertidas a preparar-se para jantar.
Os pratos principais vão chegando mais ou menos ao mesmo tempo, e percebemos que isso acontece porque está só uma pessoa na cozinha e outra na sala, para um restaurante cheio. Não temos problemas com isso, porque a nossa ideia é mesmo partilhar, picar um pouco de tudo. E começamos a picar pelo Bitoque, carne de vaca, um bom bife, servido no ponto, ovo estrelado perfeito. Podia ter mais molho, devia ter mais molho, porque o bitoque frito quer-se assim, cheio daquele molho para ensopar o pão, o arroz, as batatas…
Depois, as Iscas à Portuguesa, que aqui só falham por ser servidas com batata frita. De resto, muito boas as Iscas. Carne no ponto, tenra, muita cebola, boa molhanga. São daquelas iscas que me fizeram gostar de iscas, porque o produto é de qualidade e é bem cozinhado.
Ainda antes de falar da Feijoada à Transmontana, uma palavra para as batatas fritas que acompanham os pratos, que são fantásticas! Até perguntámos, quando fizemos o pedido, se seriam daquelas congeladas, sendo que a resposta foi imediata: “Congeladas?! Nós não temos cá disso!” E não são, não, são daquelas mesmo caseiras, cortes irregulares, de excelente qualidade, bem fritas – não há cá duplas nem triplas frituras. E até o arroz branco, soltinho, bem temperado… coisas simples, às quais damos cada vez mais valor porque também são cada vez mais raras.
Mas seguimos então para a Feijoada à Transmontana, prato do dia, este dos poucos que não acabou ao almoço (como aconteceu com o Bacalhau à Brás, o que foi uma pena). Alguma carne, alguns enchidos, molho que se calhar precisava de estar um pouco mais apurado, mas que melhora com o picante que pedimos. Não é o melhor prato da noite, até porque esse vem na outra travessa que chega ao mesmo tempo: o Lombo de Porco. Sim, essa coisa tão simples como um Lombo de Porco. Fatias finas, carne tenra, molho da carne simplesmente delicioso, daqueles que precisa de pão para desaparecer todo da travessa. Ainda bem que o Sr. Duarte nos sugeriu este prato, senão tínhamos perdido esta maravilha.
A grupeta é fixe, a conversa está boa, os jarros de vinho da casa – bem bom, já agora – continuam a chegar à mesa… mas ainda faltam as sobremesas. E aqui pedimos as três que existem, sendo que a grande (enorme!) surpresa é a mais improvável: Salame de Chocolate! Quantas vezes é que há salame de chocolate como sobremesa numa tasca? Ora, ainda bem que há aqui, porque é um salame do caraças! Não demasiado doce, com a proporção ideal entre bolachas e chocolate, uma surpresa tão grande que pedimos outra fatia já depois do café, para acompanhar a conversa e o último jarro de vinho. Mas voltando um bocado atrás, ainda há outras duas sobremesas competentes, uma Mousse de Chocolate e um Arroz Doce.
O Restaurante Sardinha tem a mística maravilhosa daquelas tascas à antiga, das quais percebemos que vamos gostar ainda a comida não começou a chegar à mesa. E isto acontece por causa do ambiente criado pelos clientes, que são uma mistura de clientes habituais tratados como quem é da casa, e turistas ocasionais que, como se sentam em mesas muito próximas, acabam por entrar no mesmo registo.
No final do jantar, ficamos ainda um bocadinho à conversa com o Sr. Duarte (agora já mais falador, com o serviço terminado) e com a D. Alda, que também já saiu de dentro da cozinha. Sorridentes, simpáticos, conversadores, gente genuína, de bem. Pessoas que, claramente, gostam daquilo que fazem. Pessoas como já há poucas na restauração em Lisboa, infelizmente. Mas é também muito por causa delas que é importantíssimo preservar tascas como o Restaurante Sardinha: porque são sítios onde tudo ainda é verdadeiro. A comida não precisa de ser surpreendente, ser servida em doses exageradas, ter muitos pratos disponíveis… não, só precisa de ser honesta e competente. Os preços baixos e a simpatia acabam por fazer o resto, que é fazer-nos querer voltar rapidamente. Para provar outros pratos ou simplesmente para dois dedos de conversa 😉
Preço Médio: 15€ pessoa (com vinho da casa)
Informações & Contactos:
Rua Jardim do Tabaco, 18 e 20 | 1100-081 Lisboa | 21 886 7437
Não tem Multibanco (nem MB Way).