TABERNA ALBRICOQUE

Uma Taberna… de Chef.

Já aqui escrevemos várias vezes sobre a principal trend do ano passado na restauração nacional: os jovens Chefs que foram abrindo “tabernas”, onde teoricamente recriam receitas tradicionais do nosso receituário… mas com twists de cozinha de autor. E seja a nível da apresentação ou das técnicas usadas, estes twists (e o próprio nome dos Chefs) faz com que o ticket médio de um jantar nestas “tabernas” ronde os 40€ pessoa. Foram vários os restaurantes deste género (Taberna do Calhau ou Frade) a abrir durante o ano, uns que foram boas surpresas… e outros que foram pequenas desilusões. No meio termo desses extremos estiveram ainda outros que são interessantes… mas que ficam assim num meio termo difícil de definir. Como é o caso da Taberna Albricoque.

A Taberna Albricoque é um projecto liderado pelo Chef Bertílio Gomes, responsável pela cozinha do Chapitô. O posicionamento está definido: cozinha de inspiração tradicional do Sul do País, especialmente Algarve. O que nos parece sempre bem, porque é uma zona de gastronomia rica (como, aliás, todo o nosso País) e porque existem excelentes referentes de restaurantes que nós adoramos. Ou seja, temos bases de comparação…. o que pode ser bom ou mau. Mas adiante.

taberna albricoque

O espaço em si ajuda muito no look de taberna, mas porque já era assim na sua grande maioria. O mármore nas paredes, os armários de madeira, as mesas de tasca à antiga. Mas o destaque é mesmo a sala dos fundos, à qual um vitral antigo chama de “sala de jantar”, e que é uma sala mais ou menos reservada para cerca de 20 pessoas, tecto em arco e com a garrafeira na parede do fundo. Pequenos pormenores de decoração com bom gosto, e isso faz da Taberna Albricoque um espaço realmente muito engraçado.

Mas vamos à comida! Na lista vemos pratos que conhecemos bem e outros dos quais reconhecemos apenas o nome, mas percebemos a referência às terras do Sul do País.

Começamos com o couvert, diferente do habitual, com a excepção do pão da Gleba, que se tornou outra moda frequente neste tipo de restaurante. Além disso temos a Cenoura Roxa de conserva com Azeitonas de Sal, uma pasta muito boa e com sabor a terra, um Azeite com infusão de Laranja e Uvas excelente, e ainda umas Amêndoas salgadas, que são o elo mais fraco mas também o mais viciante. Até agora, algumas “invenções” mas estamos bem, porque os sabores surpreendem.

taberna albricoque rissol de berbigão

Queremos provar o Presunto de Porco Preto Alentejano que vemos quando entramos na sala, e é o próprio Chef Bertílio a cortá-lo com precisão. Aliás, vemos o Chef sempre na sala, a falar com as pessoas, a orientar o serviço, enfim, a estar presente (o que é mais do que podemos dizer de muitos outros Chefs modernos). O presunto é bom, mas o destaque nas entradas vai mesmo para os Rissóis de Berbigão! Bem fritos, bem recheados, saborosos, com aquele gosto a mar que nos faz lembrar tardes de Verão algures no Algarve. Podíamos ter continuado nos rissóis o resto do jantar, porque uma coisa aparentemente tão simples foi sem dúvida o melhor do jantar na Taberna Albricoque.

taberna albricoque presunto

Porque é com os pratos principais que começamos a perceber (ou a deixar de perceber) qual é o conceito da Taberna Albricoque. A base até pode ser o receituário tradicional do sul do País, mas há aqui uma grande influência da cozinha de autor que o Chef Bertílio tem feito nos seus restaurantes. E isso resulta numa fusão diferente do que estávamos à espera, com pratos que podiam ser mais “simples” a transformarem-se em algo mais elaborado, afastando-se um pouco do que é tradicional.

É o caso da Raia Alhada, um clássico algarvio, que já conhecemos por exemplo da Noélia em Cabanas de Tavira (leiam aqui) ou mesmo da Taberna Sal Grosso, a uns metros de distância deste restaurante (também podem ler aqui o nosso review). A Raia Alhada da Taberna Albricoque não é tão simples como estamos habituados: raia, batata e um molho puxado ao alho, tão simples como isso. Aqui a raia é servida desfiada, o que lhe retira logo um pouco do sabor, e o molho sabe mais a azeite do que a alho, por isso não temos toda a acidez que é característica deste prato. Não é um mau prato, nada disso, mas já comemos melhores versões.

Por outro lado, a Galinha Cerejada, aqui servida com Figos, Amêndoas e Espinafres envoltos numa espuma completamente dispensável. Novamente, não há nada de errado neste prato… mas há demasiada coisa, elementos demais num prato que se quer simples. Os figos até dão ao prato um sabor agradável, e a galinha está cozinhada na perfeição, mas acaba por se perder o sabor base do prato, que é mesmo o da galinha. Aqui temos muitas nuances, demasiadas, na nossa opinião. Ou seja, sentimos que o prato está mais próximo da cozinha de autor do que da sua origem.

taberna albricoque prato

Atenção: não temos nada contra a re-invenção de pratos tradicionais, nada disso. Mas quando essa nova abordagem acaba por transformar a apresentação e principalmente o tipo de sabores do prato, parece-nos que deve ser assumido que se trata de um prato completamente diferente. E não há nada de errado nisso!

taberna albricoque sobremesas

No caso das sobremesas, voltamos a ter algo mais elaborado do que seria de esperar à partida, e com mais técnica do que a doçaria tradicional. Mas, em qualquer uma das duas que provámos, o que sobressai são os sabores, e esses são muito bons. Primeiro temos os Citrinos, uma sobremesa que junta um Bolo de Laranja e um Sorvete de Tangerina, sabores excelentes, texturas diferentes, uma sobremesa que “grita” Algarve. E depois temos ainda mais dessa zona do País, com a Trilogia Algarvia, que junta bolos de alfarroba e figo com um fantástico gelado de amêndoa. Aliás, a nossa sugestão é clara: juntar as duas, misturar os vários elementos, cruzar texturas… e vão ver que têm aqui uma Ode ao Algarve!

O jantar termina com o café, acompanhado de figos secos e com a oferta de um medronho. Boa atitude e bom o medronho. Lá está: coisas simples.

Há cada vez mais restaurantes a ocupar este nicho de fusão entre o receituário tradicional e a cozinha de autor. Um nicho que já não é assim tão nicho como isso… Por um lado, é interessante ver o renovado interesse na cozinha tradicional portuguesa por parte destes novos Chefs, mas por outro lado começam a perder-se sabores e técnicas mais simples, que sempre resultaram em pratos maravilhosos.

No caso da Taberna Albricoque, esperávamos algo mais próximo das raízes, tanto a nível visual como a nível dos sabores. E aqui sabemos que pode ter sido uma questão de expectativas, é verdade. Mas o que sentimos foi demasiada “fusão” na maioria das coisas que nos foram servidas, e saímos desta “taberna” sem perceber exactamente se comemos numa taberna ou num restaurante de cozinha de autor. No fundo, sentimos que o conceito devia estar um pouco mais definido: o que quer afinal ser a Taberna Albricoque?

Preço Médio: 40€ pessoa (com vinho)
Informações & Contactos:

Rua Caminhos de Ferro, 98 | 1100-395 Lisboa | 21 886 1182

1 comentário em “TABERNA ALBRICOQUE”

  1. Totalmente de acordo. Estive na Taberna e infelizmente o Chef não estava presente. Por vezes ao se pretender inovar acaba por se perder a genuinidade do prato original. Acho que é ai que alguns jovens colegas meus se perdem. Em cozinha há uma máxima simples mas inultrapassável : menos é mais.
    Dez anos de experiência também vos podem confirmar que se o original é muito bom, devemos respeitar . . .

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