Uma maravilhosa pérola (italiana) escondida!
Há restaurantes de onde saímos a pensar já quando é que lá vamos voltar. Não acontece muito (até porque tentamos sempre não repetir seguidamente os mesmos sítios… senão não tínhamos sobre o que escrever), mas há umas poucas excepções à regra. São aqueles restaurantes onde tivemos uma experiência perfeita, ou mesmo que não tenha sido perfeita, por um conjunto de vários motivos ficámos apaixonados por eles. O L’Artusi Ristorante foi o último desses casos para nós.
Já estava na nossa lista há bastante tempo, aliás, foi um daqueles restaurantes que “elegemos” no início de 2017 como restaurantes que queríamos mesmo conhecer este ano. E só vos posso dizer que demorámos demasiado tempo! Porque é uma daquelas pérolas escondidas mesmo no centro de Lisboa que toda a gente merece descobrir!
Não é fácil dar com o L’Artusi Ristorante. Fica na Rua do Merca-Tudo, mais ou menos escondida na zona menos premium de São Bento. Talvez por ficar fora das artérias principais seja um segredo bem escondido, o que ajuda a afastar quem vai à procura de um restaurante italiano “normal”. Felizmente, o L’Artusi é tudo menos aquilo que nós estamos habituados a chamar um restaurante italiano tradicional. Felizmente, acreditem.
Efectivamente, é provavelmente o italiano mais tradicional que existe em Lisboa, mas tradicional num conceito daquele que conhecemos. O conceito base do restaurante é até bastante simples, mas também igualmente brilhante!
Algures no final do século XIX, um gastrónomo italiano de nome Pellegrino Artusi escreveu um livro chamado “La Scienza in Cucina e L’Arte di Mangiar Bene” (se quisermos traduzir à letra, “A Ciência na Cozinha e a Arte de Comer Bem”). E o que era este livro? Basicamente, foi o primeiro livro a reunir receitas de todas as regiões de Itália. Ao todo são 790 receitas, onde se incluem caldos, licores, aperitivos, pratos e sobremesas. Receitas estas que agora são recriadas (com pequenas modificações e ajustes a que a cozinha moderna obriga) neste pequeno restaurante de São Bento.
Esse “peso” da história sente-se quando se entra no restaurante, cujo ambiente é completamente vintage (mas não naquele sentido “moderno a atirar para o vintage”). Tudo, desde a iluminação até ao mobiliário, passando pela decoração, cumpre o seu papel que é fazer-nos pensar que estamos numa casa italiana, algures no final do século XIX. Tudo muito cuidado, cheio de pormenores deliciosos, sem muitas mesas, porque o que se pretende é uma experiência intimista.
E essa experiência intimista e próxima passa em muito pelo serviço, que efectivamente nos faz sentir parte da casa. A senhora que nos atende é todo um espectáculo, com o seu misto de português e italiano, a explicar-nos os pratos, a dizer graçolas, a contar histórias. Podia ser uma tia num jantar de família, tal é o à-vontade que nos faz sentir. Apetece levá-la para casa! 🙂
Quando nos sentamos na mesa já estamos envolvidos em todo este mundo, que até a louça acompanha. Apetece tirar fotografias a tudo, mas já ficou tudo também guardado na memória. Como acontece às coisas boas.
A ementa, exactamente por ser baseada num livro com centenas de receitas, vai mudando regularmente. Há pratos que, por serem emblemáticos, se vão mantendo, mas é normal que algumas das coisas que provámos já não estejam na lista. E isto é outra coisa maravilhosa no L’Artusi: mesmo com uma carta pequena, podemos lá ir repetidas vezes e nunca comer a mesma coisa.
O nosso jantar começa com um pequeno “mimo da casa”, uns pastéis de beringela com uma maionese. É uma brincadeira, para irmos trincando enquanto decidimos o que vamos pedir.
Seguindo recomendações (e se há algum restaurante em Lisboa onde devem mesmo seguir as recomendações, ele é sem dúvida o L’Artusi), seguimos com o Crostini Tuscani: um misto de manteigas e patés diversos, tudo excelente, sobre um simples pão bem torrado. Simples e bom, não é preciso mais.
A “luta” pelos pratos principais é intensa, porque todos queremos comer tudo e por isso temos de decidir quem fica com o quê. Eu fiquei com o Ossobuco, receita nº 358 do livro, e que é daqueles pratos que, quando bem confeccionado, se torna num dos preferidos de sempre. Ora, o Ossobuco do L’Artusi é sem sombra de dúvidas o melhor que já comi em Portugal, mas assim de longe! A carne que se desfaz do osso, o fantástico molho espesso de tomate, farinha, cebola, cenoura e muitas outras coisas, o toque final a alecrim. Tudo neste prato é perfeito, mesmo a polenta que acompanha a carne – não sou nada fã de polenta, mas aqui faz todo o sentido.
Do outro lado da mesa, o Filete de Robalo Ensopado, receita nº 461. Aqui trata-se de uns belos filetes com um molho que tem por base o limão, um prato extremamente fresco e que à partida não associamos nada à cozinha italiana tradicional, mas que volta a surpreender por ser tão bem confeccionado e ter sabores tão caseiros!
Chega à mesa um prato de acompanhamentos, que serve tanto para o ossobuco como para o peixe: legumes gratinados com queijo, batata assada e um bolo de batata com legumes, tudo muito fresco e interessante.
Mas ainda estava para chegar o último prato, aquele que na ementa achámos que seria o mais normal (tendo em conta o que vemos nos outros restaurantes italianos). Mas nada disso! O Ravioli lla Genovese é a receita nº 99 do livro do senhor Artusi e, minha gente, podemos dizer-vos que é assim qualquer coisa de fantástico!! Os ravioli em si já são perfeitos e frescos, mas o recheio (e o molho) é assim uma coisa do outro mundo! Está tão bom que perguntamos o que é, mas na realidade é relativamente simples (frango, cordeiro, fígado, manteiga, presunto, parmesão). “O importante é que os ingredientes sejam frescos e fica sempre bom!”, dizem-nos da forma mais despretensiosa do mundo. É esta simplicidade que faz da comida italiana uma das melhores do Mundo, e neste caso do L’Artusi um restaurante imprescindível de visitar!
Depois de 3 pratos maravilhosos, a expectativa em relação às sobremesas era grande. Especialmente porque a única da qual tínhamos ouvido falar é a receita nº 649, o “famoso” Doce Turim. Uma espécie de bolo com base de bolacha embebida em licor, mas que depois leva chocolate, açúcar de baunilha, avelãs e ainda frutos vermelhos. Só pelo aspecto percebemos logo que não deve ser nada fácil de fazer, mas também percebemos logo que vai ser muito boa. E é!
Outra das sobremesas é o Pudim de Limão, que é outra fenomenal surpresa, pela textura, pelo sabor, pelo empratamento. Uma sobremesa fresca mas que ao mesmo tempo nos aquece por dentro.
Finalmente, o Gelado de Amaretti, que sendo bom, não deixa de ser a sobremesa menos surpreendente.
Um jantar verdadeiramente inesquecível!
Ao sair do L’Artusi, voltamos para trás para reler o que está escrito no toldo: “L’Arte di mangiar bene”. Sim, é verdade. É impossível não sair do restaurante sem ter a certeza de que tivemos um jantar fenomenal.
Mas digo ainda mais mais: a arte de bem receber, a arte do bom gosto, a arte de ser humilde e verdadeiro. O L’Artusi Ristorante é isso tudo. Um italiano diferente de todos os outros italianos, onde vamos ter sempre uma experiência única. Uma pérola escondida que merece ser (re)conhecida por toda a gente. Um restaurante quase perfeito. E, para nós, um dos grandes destaques deste ano!
Preço Médio: 28€ pessoa (com vinho)
Informações & Contactos:
Rua do Merca-Tudo, 4 | 1200 267 Lisboa | 21 396 9368
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Pois eu também já lá fui, mas a mim não me entusiasmou. E comi o ossobuco, como não podia deixar de ser. A carne estava rija e faltava o sabor milanês. Nada como lá voltar para mudar, ou não, de opinião. Acho a ideia muito engraçada (é como fazer um restaurante baseado no Livro de Pantagruel), mas tudo depende da execução.