Ou quando um restaurante é uma história de vida…
Se há uma coisa que repito constantemente nestes textos é a ideia de que, pelo menos para mim, um restaurante é muito mais do que a comida. É o espaço, o serviço… mas acima de tudo é a história com que nos envolve. Mais do que uma refeição, aquilo que espero é uma experiência, que me faça viajar, que seja única.
E se é verdade que os restaurantes em Lisboa estão cada vez mais pré-formatados e menos diferenciados entre si, também é verdade que se vão encontrando excepções. O Tayybeh foi um desses últimos casos e, mais do que a comida, aquilo que realmente me fascinou foi a história por detrás deste restaurante sírio, o primeiro (e único, que eu saiba) em Lisboa.
E o Tayybeh é muito mais do que uma história de refugiados. Sim, isso até podia ser um gancho forte para levar pessoas ao restaurante, mas bastaram uns poucos minutos de conversa com o Alan e a Ramia (os responsáveis pelo espaço) para perceber que não é isso que eles pretendem. O objectivo do Tayybeh é dar a conhecer uma cultura e uma gastronomia muito diferentes da nossa, e fazê-lo sempre que possível através de um enquadramento pessoal da história dos donos. Porque todos os pratos têm uma história por trás, quer seja de família quer seja um facto histórico que muitos de nós desconhecemos.
A nível da comida, confesso não ter ainda experiência suficiente para perceber ou sequer identificar as nuances gastronómicas das comidas dos vários países do Médio Oriente. Em Lisboa já temos restaurantes fenícios, libaneses, iranianos ou israelitas, é verdade… mas um olhar nas ementas e parece-me que existem muitos pontos em comum.
Por isso, não é de estranhar encontrar também aqui no Tayybeh muitas coisas já nossas conhecidas.
Por exemplo, as entradas podem ser servidas em formato “mezze” e trazem-nos coisas mais conhecidas como o Hummus, o Falafel, o Kibbeh ou a fantástica Batata Harrah (que, na minha modesta opinião, devia acompanhar todos os pratos do Mundo!). Mas também podemos provar coisas menos habituais como o Mutabal (molho de beringela fumada com iogurte, tahine e limão), o Muhamara (pimento vermelho e tomate misturados com nozes e molho de romã e azeite) ou o Yalanji (uma folha de videira recheada com arroz, tomate, salsa, hortelã e azeite), quase tudo vegetariano mas com tantos aromas e sabores diferentes que nos ajudam a fazer a tal viagem de que falava. Doses muito pequenas, para partilhar entre todos os que se sentam à mesa.
Enquanto as entradas servem para começar a partilha e “abrir as hostilidades”, no Tayybeh são os pratos principais que nos trazem também as histórias vindas de um mundo que não é o nosso. A cada prato que chega à mesa está associada uma parte da história destas duas famílias que se uniram, ou então uma explicação cultural que nos ajuda a entender os costumes sírios. E é isto que dá um sabor especial aos pratos, é este enquadramento que os torna mais interessantes.
Pratos como o Herraa Esbao (massa farfalle com lentilhas e grão de bico, misturada com cebola, alho, coentros e cubos de pão frito), o Shish Bil Fakara (servido num pote coberto com massa filo, é basicamente uma bomba de molho bechamel misturado com queijo sírio onde temos depois pedaços de peito de frango, cogumelos e batatas), o Bulgur Bil Bandoura (bulgur com tomate, batata e cebola, o prato menos interessante da noite) ou Kenaffe Laham (massa kadaif com carne de novilho picada, molho bechamel, pistache e romã).
Um ligeiro destaque para o Uzi (massa filo recheada com carne moída, arroz basmati, ervilhas, cenouras e amêndoas) e para o Musakan Tayybeh (perna de frango com cebola, especiarias sírias e sumac, servida sobre pão sírio), pratos um pouco mais intensos e exóticos que os restantes a nível de sabor.
Doses bem servidas, mas realmente este é o tipo de gastronomia onde a partilha é essencial e faz parte da experiência. Aliás, é uma das coisas que partilham connosco, sobre as refeições em família.
Finalmente, as sobremesas são provavelmente o menos interessante no Tayybeh, ou se calhar na cozinha síria em geral. Diferentes sim, mas demasiado doces e sem contrastes de sabor. A Baklava (massa filo recheada com pistache) já conhecemos de outros restaurantes, e aqui é muito bem feita e com muito pistachio, além de acompanhada com gelado, o que lhe corta o excesso de doce.
Mas isso já não acontece tanto com o Kenaffe (kadaif com queijo sírio doce) como com o Halawa Jeben (sêmola com queijo sírio doce), sobremesas extremamente fortes. Aqui nem com histórias e curiosidades lá vamos…
Felizmente podemos terminar a refeição com um café sírio, feito da maneira tradicional, numa espécie de areia quente. Intenso, aromático, cheio de personalidade. Um excelente final para uma viagem ao Médio Oriente.
Mesmo com alguns pormenores a precisarem de ser trabalhados – a iluminação pouco seccionada, uma decoração desequilibrada, a falta de explicação na ementa sobre o número de pratos a pedir ou mesmo a falta de sabor de alguns desses pratos – o Tayybeh é uma experiência muito interessante. E é tão melhor quanto mais imersiva for, ou seja, quanto mais nos deixarmos envolver nas histórias do Alan e da Ramia. Percebo que para eles possa não ser fácil dar a mesma atenção a todas as mesas com a casa cheia, mas isso é essencial neste tipo de restaurante (até porque o facto de ficar em Moscavide não ajuda muito…).
Para mim, foi uma experiência gastronómica interessante, mas uma experiência cultural fora de série. E isso é algo que pode tornar o Tayybeh num restaurante único.
Preço Médio: 16€ pessoa (com chá)
Informações & Contactos:
Estrada de Moscavide, 62 A | 1800-279 Lisboa | 910 913 667